Estórias de Cada Um

JUCÁ

Homem e mulher sorrindoDescrição gerada automaticamente Homem com óculos de grau Descrição gerada automaticamente

Caramba, realmente estamos vivendo uma Viagem no Túnel do Tempo, 29 anos depois. Que bom rever e ouvir falar de tantos vocês. É Luzamba, tem muitas histórias, algumas mal contadas e várias outras jamais contadas.

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Porém toda história tem pelo menos dois lados. Além dos LEOPARDOS e HIENAS, a Fauna de LUZAMBA possuía também outras espécies. Pelo menos, as OVELHAS e os CÃES PASTORES, que cuidavam atentamente do rebanho (ou pelo menos parte dele)

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Comunicação em Luzamba

Como parte do grupo de pouco mais de 20 pioneiros, chegamos em Luzamba em Agosto de 1991 num cenário muito diferente do que viria a ser a Vila de Luzamba dentro de poucos meses depois.

Eram um total de 5 ou 6 casas na antiga Vila, sendo que 3 estavam ocupadas e as demais passavam por reformas. Lembro que na casa em que ficamos éramos 10 ou 12 num só quarto, dispostos em beliches, porém com apenas 1 banheiro para atender toda essa turma.

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O segredo era dormir o mais cedo possível e também acordar antes dos demais. Assim escapávamos da sinfonia de roncos a noite, bem como da fila do banheiro na manhã seguinte.

Nesses primeiros dias estávamos literalmente ilhados de comunicação com Luanda e o resto do Mundo. Mas daí a alguns meses (não recordo quando exatamente), apareceu um telefone “portátil” tipo InMarSat, o qual se podia comunicar através do sistema satelital normalmente utilizado pela navegação mercante internacional, porém de custo bem elevado. Apenas para se ter uma ideia, o custo de uma ligação para o Brasil era de um pouco menos de USD 10.00/minuto.

Nos primeiros meses, pela situação de isolamento e da saudade da família no Brasil, nós gastávamos “pequenas fortunas” todos os meses em Comunicação (via InMarSat).

Isso era um peso muito grande para todos nós, lembro que havia casos que os mais saudosos gastavam mais de USD 2,000 num único mês em telefonemas para o Brasil. Aliás nesse quesito havia uma Doutora que era a campeã nos gastos telefônicos mensais.

Diante desse cenário, precisávamos encontrar uma alternativa a esse elevado custo mensal. Foi aí que, nosso amigo Ivon Job, que era Rádio Amador no RS, havia questionado por que nós não usávamos rádio amadores para nos comunicar com nossos familiares no Brasil. A ideia era muito boa, mas havia vários inconvenientes:

não havia equipamentos disponíveis para comprarmos em Angola;
não havia sequer a regulamentação para esse tipo de serviço em Angola;
a grande maioria dos luzambenses sequer sabia manusear esse tipo de equipamento;
da mesma forma, as famílias na outra ponta, no Brasil, tampouco tinham equipamento, conhecimento, registro, etc.

Ou seja, era uma boa ideia, porém de difícil implementação. Mas aquilo não me saía da cabeça, afinal gastava em torno de USD 900 a 1,000 todos os meses com as ligações para casa através do InMarSat.

Foi quando surgiu uma oportunidade real por meio de um curso de planejamento em Miami (Primavera Project Planner), que duraria uma semana, e, uma vez lá eu poderia comprar os equipamentos necessários, ter uma alternativa real e resolver o problema de comunicação com a família.

E, com a orientação do amigo Ivon Job, fizemos a lista dos equipamentos a serem comprados para implementarmos essa operação, que eram: 2 rádios, 2 amplificadores, 2 fontes e 2 antenas, um jogo para Angola (Luzamba) e outro para o Brasil (em casa). Além de 1 phone patch (também conhecido como Maricota) para servir de ponte no Brasil para quando eu quisesse falar com familiares em outras cidades no Brasil.

Fiquei muito empolgado com a ideia e comecei a fazer a cotação para a compra dos equipamentos. Em paralelo tentei “vender” essa ideia a vários amigos, para que eles comprassem um kit de equipamentos para suas casas e nós dividiríamos o custo do kit “Luzamba”. Apesar da minha empolgação, ninguém se animou com a ideia.

Muito bem, fui a Miami, comprei todos os equipamentos. Na volta, passei pelo Brasil, instalei os equipamentos em casa e retornei para Angola.

Chegando em Luzamba, nessa época já estávamos instalados em trailers e ali fiz a primeira instalação da antena e comecei a conhecer e entender melhor o funcionamento do rádio. O Ivon me ajudou bastante na instalação e primeiros passos de radioamadorismo.

Em paralelo não posso deixar de fazer referência a nosso pessoal de Comunicações, afinal eles conseguiram meu registro junto ao Ministério das Comunicações, o D2A XYK, que veio a ser o 1º Registro Oficial de Rádio Amador de Angola desde sua Independência.

O aprendizado do radioamadorismo foi um processo meio autodidata, pois através de minhas tentativas de conexão – completamente às escuras – conheci o Madeira, um português que vivia em Johanesburgo e que havia saído corrido de Angola na época da Independência de Portugal. O Madeira foi um grande professor e me ensinou muitos detalhes e dicas a respeito do radioamadorismo. Inclusive através dele, comecei a frequentar o Brasil DX Net, que é uma rede de radioamadores brasileiros espalhados em todo o mundo e que se reuniam todos os domingos em 28.430 MHz às 10h00 GMT. Atualmente esse encontro é diário, desde as 12h GMT.

São muitas lembranças dessa época, inclusive me lembro que poucos meses depois, mudei para a Guest House, e fiquei instalado no Quarto 14 juntamente com o amigo Dr Mariano. Isso me dá uma grande nostalgia. Nesse período, vários amigos passaram a frequentar o Quarto 14, quase que diariamente, pois contavam com a ajuda de minha esposa, Anna Paula, que fazia a conexão com suas famílias – através do phone patch – e assim eles podiam matar as saudades dos seus entes queridos.

Nessa época, um fato muito marcante para mim e que está diretamente ligado ao radioamador, pois foi por seu intermédio que escutei meu filho Thiago dizer PAPAI pela primeira vez. Foi uma emoção muito grande.

Vale destacar que após esse grande sucesso “de público e crítica” a empresa se motivou a comprar um equipamento e deixá-lo a disposição para que os demais colaboradores entre operadores, oficiais e outros pudessem ter acesso a comunicação com suas famílias, sem custo.

Nessa ocasião foi feito um contrato com a Sra. América, uma radioamadora de Curitiba, já aposentada, com quem eu mantinha contatos frequentes. Ela, então passou a prestar o mesmo “serviço” de Anna Paula, para que os colaboradores pudessem falar com suas famílias.

Com a invasão da UNITA, o Rádio Farol da pista de pouso e que servia de orientação para a aproximação das aeronaves foi destruído. Assim, o rádio do Quarto 14 ficou de stand-by e também serviu de back-up no auxílio para as demais aeronaves C-130 de resgate. Ou seja, teve um papel coadjuvante na retirada do pessoal de Luzamba.

Uma última ação vinculada a experiência adquirida no radioamadorismo foi quando estávamos abastecendo os DC-10 em Brazzaville – fato já relatado por outros e com riquezas de detalhes – onde pude, desde o cockpit, falar com amigos radioamadores no Brasil e pedir que fizessem contato com a CNO, orientando que os futuros aviões de resgate evitassem Luanda, em função da experiência vivida a poucas horas atrás. Pois, imaginávamos que não haveria condições seguras para operar desde Luanda.

Não sei ao certo se isso ajudou, mas o fato é que os voos seguintes com pessoal proveniente tanto de Luzamba quanto Capanda, decolaram de Brazzaville no Congo ou Windhoek na Namíbia.

Por fim, após toda essa experiência vivida, o rádio em Luzamba foi perdido, como muitas histórias ali vividas, mas que agora estão sendo revividas e estão sendo contadas com riqueza de detalhes.

Porém o rádio que eu tinha em casa, em João Pessoa, o vendi para Delmar que o instalou em sua fazenda no Piauí. Talvez ainda esteja por lá…

JUVEIL

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